Quase por unanimidade, o Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (9) pela validade da Lei
Maria da Penha – que pune violência doméstica contra mulheres – mesmo sem
manutenção da denúncia pela vítima. O relatório do ministro Marco Aurélio de
Mello tratou de uma iniciativa da Procuradoria-Geral da República, alegando que
agressões contra mulheres não são questão privada, mas sim merecedoras de uma
ação penal pública.
A partir de agora, Ministério
Público passará a ter a prerrogativa de denunciar agressores e as vítimas não
poderão impedir que isso aconteça. A lei não será aplicada apenas em casos de
lesões leves ou culposas (acidentais). Hoje, para ter validade, é necessária
uma representação da agredida e a manutenção da denúncia contra o agressor.
Estatísticas indicam que até 90% das mulheres desistem no meio do caminho.
Os críticos da Maria da Penha
alegam exatamente que ela fere o princípio da isonomia ao tratar a mulher de
forma diferenciada. A única divergência no julgamento foi do presidente da
corte, Cézar Peluso. Ele discordou da falta de exigência de denúncia da vítima
porque “o ser humano se caracteriza por ser sujeito da sua história”. O
ministro disse ainda que tem “esperança de que a maioria esteja certa”.
Já para o ministro-relator,
deixar a denúncia a cargo da vítima “significa desconsiderar o temor, a pressão
psicológica e econômica, as ameaças sofridas, bem como a assimetria de poder
decorrente de relações histórico-culturais, tudo a contribuir para a diminuição
de sua proteção e a prorrogação da violência”. Gilmar Mendes chegou a cogitar
um pedido de vistas que adiaria a decisão, mas acabou desistindo da ideia.
O vice-presidente do Supremo,
ministro Carlos Ayres Britto, afirmou que uma lei clara com eficácia
independente da vítima funcionará melhor para defender as agredidas do que
repassar a elas a decisão de processar os agressores. “A mesma liberdade para
lobos e cordeiros é excelente para os lobos”, disse.
Mais cedo, o Supremo referendou
por unanimidade a validade da lei, provocado por uma ação declaratória de
constitucionalidade enviada pela Presidência da República em 2007. Na ocasião,
estimulado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ele afirmou que o
mecanismo é uma necessidade para atenuar distorções sociais que separam homens
de mulheres.
De acordo com Marco Aurélio, “a
mulher é eminentemente vulnerável quando se trata de constrangimentos físicos,
morais e psicológicos em âmbito privado” e a Justiça deve tratar os desiguais
de forma desigual para que haja igualdade real. “A abstenção do estado na
promoção da igualdade de gêneros implica situação da maior gravidade
político-jurídica”, disse.
A mais eloquente durante o
primeiro dos dois julgamentos foi a ministra Cármen Lúcia. Ela afirmou que até
ministras do Supremo sofrem preconceito de gênero. “Há os que acham que não é
lugar de mulher, como já me disse uma determinada pessoa sem saber que eu era
uma dessas”, disse. “Gostamos dos homens. Queremos ter companheiros. Mas não
queremos carrascos.”
Ganhou a solidariedade do colega
Luiz Fux. “Quando uma mulher é atingida, todas são atingidas. Me solidarizo e
digo que nós, homens de bem, também nos sentimos atingidos quando uma mulher
sofre violência doméstica.”
UOL
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